BOLSA ESCOLA
O programa brasileiro Bolsa Escola (BE) consiste na transferência de renda para famílias pobres, condicionada à regularidade da frequência escolar dos seus filhos e filhas. O programa faz parte do que se conhece como políticas focalizadas com intervenção sobre a demanda. Isto é, políticas que tentam combater a pobreza atuando diretamente sobre os indivíduos e/ou famílias pobres com a intenção de ampliar suas possibilidades de acesso a serviços e recursos de diversos tipos. Esses programas são considerados experiências inovadoras de luta contra a pobreza (VILLATORO, 2004), o que explica seu notável protagonismo entre as políticas sociais e educativas desenvolvidas na América Latina nos anos noventa assim como sua crescente legitimidade no plano internacional (SCHWARTZMAN, 2010). O programa BE, em particular, é um dos pioneiros nesse campo e constitui uma das referências mais significativas desse tipo de intervenções focalizadas (BONAL; TARABINI, 2006). Destaca-se ainda que desde sua origem vem sendo apresentado por organismos internacionais e por governos nacionais como modelo a seguir na luta contra a pobreza (TARABINI, 2008a).
O programa inclui-se entre os Programas de Garantia de Renda Mínima (PGRM) iniciados no Brasil, na primeira metade da década de noventa e, diferentemente de outros programas similares aplicados em outros países latino-americanos, caracteriza-se por ter uma origem descentralizada, ligada aos governos municipais. A primeira aplicação do programa se realizou em 1995, em Brasília (DF), com a intenção de alcançar três objetivos: 1) aumentar o nível de vida das famílias em curto prazo, 2) reduzir o trabalho infantil e 3) otimizar a permanência das crianças na escola, melhorando seu nível educativo e contribuindo assim para a redução do seu nível de pobreza futura.
Os diagnósticos altamente favoráveis sobre a experiência em Brasília e a extensão dos debates sobre esse tipo de programas incentivaram muitos outros governos municipais a maioria deles governados pelo PT – Partido dos Trabalhadores a aplicar programas desse tipo em seus respectivos municípios, provocando uma generalização dos mesmos no país, durante a segunda metade dos anos noventa. As diferentes modalidades do programa aplicadas no nível municipal se diferenciaram tanto pelo seu desenho como pela sua forma de gestão e implementação, porém todos coincidiram em seus objetivos e nos critérios gerais de seleção da população. Em relação aos objetivos, houve um consenso geral a partir daqueles estabelecidos pelo programa pioneiro em Brasília, exceto por pequenas mudanças que respondiam a características específicas dos diversos municípios. Em relação aos sistemas de seleção, os diversos programas municipais compartilharam os critérios complementares de renda familiar, idade dos filhos e tempo de residência no município; estabelecendo como famílias potencialmente elegíveis todas aquelas com uma renda familiar per capita inferior a um determinado nível predefinido (geralmente a Linha da Pobreza), com algum filho em idade escolar (preferencialmente no ensino fundamental) e um tempo mínimo de residência no município que variava de um a cinco anos. As famílias que cumprissem com os requisitos e fossem aceitas para participar no programa receberiam uma transferência de renda mensal condicionada à frequência regular de seus filhos a um centro escolar.
A partir de 1997, e dado o sucesso da maioria das experiências municipais, começou-se a aplicar sob o governo de Fernando Henrique Cardoso do PSDB, Partido da Social Democracia Brasileira uma modalidade federal do programa, criada inicialmente para oferecer apoio financeiro aos municípios pobres com dificuldades para desenvolver o programa autonomamente. A partir de 2001, o programa estendeu-se em nível nacional e, com isso, sua gestão e implementação delegaram-se às secretarias municipais de educação, ficando sob responsabilidade da Secretaria Nacional a fiscalização de sua execução e a efetivação da transferência monetária aos beneficiários. No caso de municípios que dispunham de programas BE próprios, estabeleceram-se acordos entre as duas administrações competentes para possibilitar a articulação entre ambos os programas.
A partir de 2003, e em decorrência da mudança do governo federal no Brasil, o Programa BE passou a integrar o Programa Bolsa Família, o que gerou transformações importantes nas características do mesmo. De fato, o Programa Bolsa Família faz parte do Programa Fome Zero, política pública orientada a combater a fome e a exclusão social em todo o país e eixo orientador do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Esse programa tem unificado todos os programas de transferência de renda existentes no país até o momento (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e Cartão Alimentação), acarretando o desaparecimento do programa BE como um programa autônomo (TARABINI, 2008b).
Atualmente, portanto, o programa BE não existe como tal, senão como um componente a mais do programa Bolsa Família. Sua importância, contudo, deriva tanto de seu caráter pioneiro como de sua elevada estabilidade. Não só se trata de um dos primeiros programas desse tipo aplicados na América Latina, mas, além disso, tem sido aplicado em diferentes escalas político-administrativas e por governos de diferentes matizes políticas e tem recebido apoio de diversos organismos de financiamento internacional. Aliás, a lógica do programa vem impregnando as políticas sociais que se aplicam atualmente tanto no Brasil como no conjunto da região latino-americana, exercendo uma influência central nas políticas contemporâneas de luta contra a pobreza.