DEMOCRACIA PARTICIPATIVA NA ESCOLA

Autores/as: LÚCIA DE FÁTIMA MELO

Refere-se à participação efetiva de todos os envolvidos e interessados nas deliberações da escola: professores, diretores, equipe pedagógica, funcionários, pais e alunos. O processo de democratização da gestão da escola pública no Brasil está estritamente relacionado ao conceito de democracia e especialmente à democracia participativa. O conceito de participação tem se constituído em uma preocupação presente nas discussões da sociedade civil organizada (desde o final da década de 1970), a respeito das formas de administrar a ação pública. Na perspectiva de Gohn (2001), o entendimento dos processos de participação da sociedade civil e sua presença nas políticas públicas conduzem ao entendimento do processo de democratização da sociedade brasileira; o resgate dos processos de participação leva às lutas da sociedade por acesso aos direitos sociais e à cidadania. Nesse sentido, a participação é, também, luta por melhores condições de vida e pelos benefícios da civilização. No entanto, a discussão sobre a participação, enquanto categoria analítica é mais problemática do que parece. O tema da participação tem uma longa tradição de estudos e análises (principalmente na área da ciência política) que podem conduzir a diferentes resultados. Ele pode ser observado nas práticas cotidianas da sociedade civil, quer seja nos sindicatos, nos movimentos sociais, quer em outras organizações como a escola, bem como nos discursos e práticas das políticas estatais, com sentidos e significados completamente distintos. Por esse motivo, são pertinentes as considerações de Catani e Gutierrez (1998) sobre o tema da participação cidadã enquanto prática social voltada para a substantivação da democracia nas instituições públicas. Para os autores, participação é transferir a autoridade e a responsabilidade pela gestão de um bem público para o grupo diretamente envolvido no trabalho sendo uma prática democrática e socialmente justa, desde que não se escondam por trás o incentivo a ações de natureza corporativa e tampouco a intenção por parte do Estado de se desfazer de suas obrigações para com a população. Nesse sentido, Thomas Popkewitz (1997) frisa que há diferentes formas, sentidos e significados que podem ser atribuídos ao ideal de “participação”. Conforme escreveu em sua análise sobre as reformas educacionais, a retórica da participação, em muitos casos, substitui as práticas de participação democrática. Isso é possível por meio da redefinição estreita da noção de democracia, na qual a participação de diferentes atores envolvidos consiste em aplicar as regulamentações e interpretações administrativas que parecem surgir de ninguém, mas que têm sua elaboração centralizada no governo ou em determinado setor da sociedade.  São utilizadas estratégias de controle, regulação e convencimento que acabam por produzir o confinamento da democracia a uma prática que não questiona quem delibera, mas, sim, conforma-se com a aplicação e fiscalização das deliberações. A perspectiva de Dourado (2003) sobre a gestão democrática da escola pública reforça o elo entre esta e a participação, enquanto prática social de exercício da cidadania, considerando-se os direitos cidadãos o substrato da democracia. No seu entendimento, a gestão democrática da escola pública significa o processo de aprendizado e de luta política que não se circunscreve aos limites da prática educativa, mas vislumbra, nas especificidades dessa prática social e de sua relativa autonomia, a possibilidade de criação de canais de efetiva participação e de aprendizado do “jogo” democrático e, consequentemente, do repensar das estruturas de poder autoritário que permeiam as relações sociais e, no seio destas, as práticas educativas. Hoje a participação é considerada como uma importante estratégia política tanto pelos setores progressistas como por aqueles setores tradicionalmente contrários ao avanço das forças populares, ao reconhecimento da igualdade de direitos, inclusive o direito relativo à educação para todos. Também Gracindo (1995) define a gestão democrática como aquela capaz de desenvolver processos e objetivos na delimitação de suas políticas, na elaboração de seus planejamentos e no desenvolvimento de sua gestão, fazendo-se necessário o exercício de práticas construtivas dessa gestão no sistema educacional. De acordo com a autora, essas práticas devem envolver: a escolha de dirigentes pela comunidade escolar e local; a forma colegiada e descentralizada de administração; a relação entre a escola e a comunidade com a decorrente participação popular; a liberdade propiciada aos estudantes e aos professores para a organização de associações e grupos representativos. Em decorrência desse entendimento, a questão da participação situa-se como um dos eixos fundamentais da reflexão apresentada. Parte-se do entendimento de que ela é condição sine qua non na construção da gestão democrática nas unidades escolares. Bobbio (1987) bem expressa seu significado ao estendê-la do campo da sociedade política ao campo da sociedade civil. A gestão democrática, as deliberações coletivas devem ser tomadas por representantes governamentais e das organizações da sociedade civil em proporções definidas pelos estatutos e regimentos internos de cada política que esteja sendo definida e/ou implementada, atribuindo um caráter institucional aos referidos órgãos. Todavia, a forma de escolha e nomeação desses representantes deve assumir um caráter democrático. Dessa forma, o ideal democrático só poderá ser vislumbrado quando a gestão da escola for realizada pelos próprios representantes da comunidade escolar. Nos últimos anos, os estudos acadêmicos, as políticas públicas, as documentações oficiais – leis, decretos, resoluções, portarias, pareceres, recomendações, parâmetros – concebem a participação desses segmentos como estratégia central da melhoria da qualidade do ensino, entendendo que a questão do pertencimento gerado por ela cria e consolida o envolvimento e o compromisso dos educadores e demais segmentos da comunidade escolar com o projeto político pedagógico que deve estar em construção permanente e com a problemática da eleição de diretores. Por fim, é preciso registrar que a participação deve ocorrer desde a elaboração dos projetos, o dimensionamento e detalhamento das metas até a tomada de decisões, execução, avaliação e redirecionamento, quando necessário. Recebe também outras denominações: Gestão Democrática da Escola, Gestão Colegiada e Gestão Participativa.

Bibliografia

BOBBIO, N. Estado, governo, sociedade: para uma teoria geral da política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

CATANI, A. M.; GUTIERREZ, L. Participação e gestão escolar: conceitos e potencialidades. In: FERREIRA, N. S. C. (Org.). Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. São Paulo: Cortez, 1998.

DOURADO, L. F. (Org.) Gestão democrática: a perspectiva dos dirigentes escolares da rede municipal de Ensino de Goiânia-GO. Goiânia: Alternativa, 2003.

GOHN, M. G. Conselhos gestores e participação sociopolítica. São Paulo: Cortez, 2001. (Coleção questões da nossa época; v. 84).

GRACINDO, R. V. Democratização da educação e educação democrática: duas faces de uma mesma moeda. Ensaio, Rio de Janeiro, v. 3, n. 7, p. 149-156, abr./jun. 1995.

POPKEWITZ, T. Reforma educacional: uma política sociológica: poder e conhecimento em educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.