DISFONIA OCUPACIONAL DOCENTE

Autores/as: ADRIANE MESQUITA DE MEDEIROS

Refere-se ao Distúrbio de Voz Relacionado ao Trabalho, terminologia proposta no 3º Consenso Nacional sobre Voz Profissional (2004). A expressão explicita que, por um lado, tais alterações vocais podem ou não apresentar lesões orgânicas na laringe e, por outro, destaca o fato de a alteração ter sido adquirida na relação do sujeito com seu trabalho, acarretando dificuldade para o desempenho de sua função ocupacional. Segundo Souza (2005), o distúrbio vocal relacionado ao trabalho é apresentado como qualquer alteração vocal diretamente relacionada ao uso da voz durante a atividade profissional que diminua, comprometa ou impeça a atuação e/ou a comunicação do trabalhador. O professor é considerado profissional da voz porque depende de certa qualidade vocal específica para o desempenho do trabalho. A disfonia, segundo Vilkman (2000), deve ser classificada de acordo com a demanda da qualidade da voz e da sua intensidade. Os professores necessitam de uma voz de qualidade moderada e de alta intensidade e a grande demanda vocal no desempenho do seu trabalho pode resultar em disfonia. Ela se desenvolve gradativamente e, ao atingir o estágio crônico, torna-se intratável e incapacitante (VILKMAN, 2000). A disfonia pode se manifestar por meio de rouquidão, falhas na emissão, esforço para falar, fadiga vocal, pigarro constante, dor ou desconforto na região da garganta e do pescoço, dentre outros (BEHLAU; DRAGONE; NAGANO,2004). Pesquisas mostram a elevada prevalência de disfonia entre as principais causas de adoecimento dos professores nos diversos níveis de ensino, nas escolas públicas e privadas e em várias localidades (ARAÚJO; CARVALHO, 2009; MEDEIROS; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2008). De forma geral, o trabalho influencia a voz do docente em razão das condições ambientais e organizacionais de trabalho e dos aspectos da atividade profissional implicados na interação entre o professor e o aluno. Alguns fatores de risco ambientais são: presença de ruído elevado na sala de aula, ventilação precária, trabalhar em outra atividade com uso intensivo da voz (MEDEIROS; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2008), tempo de trabalho como docente, carga horária de trabalho excessiva (ARAÚJO et al., 2008). A intensificação do trabalho, a partir da ampliação das demandas profissionais sem o suporte social necessário, e a precarização das condições de trabalho, juntamente com a desvalorização profissional refletem na saúde da voz do professor (GARCIA; ANADON, 2009; ASSUNÇÃO; OLIVEIRA, 2009). Quanto aos aspectos da atividade profissional que podem afetar a voz, encontram-se diferentes estratégias de aula, domínio da sala, concepção de educação e na maneira particular de cada professor usar a sua voz, tendo em vista os contextos específicos da sala de aula (NORONHA, ASSUNÇÃO; OLIVEIRA, 2008; VIANELLO; ASSUNÇÃO; GAMA, 2008). Outros fatores desencadeantes ou mantenedores da disfonia são problemas de vias aéreas superiores, como as rinites alérgicas, quadros de depressão e/ou ansiedade (MEDEIROS; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2008), além dos de cunho biológico (predisposição hereditária) e dos hábitos individuais como hidratação, fumo, atividade física e outros (BEHLAU; DRAGONE; NAGANO, 2004). Os distúrbios de voz podem ter diversos impactos na carreira docente. Os resultados do estudo de Jardim et al. (2007) indicam a qualidade de vida como dimensão fundamental para analisar a disfonia no trabalho docente e ainda associação entre condições inadequadas de trabalho e pior qualidade de vida relacionada à voz. Os professores sentem dificuldade no desempenho do trabalho e consequentemente se ausentam por problemas vocais (ROY et al., 2004, MEDEIROS; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2008). A severidade da disfonia é estimada indiretamente através do prejuízo na realização do trabalho (SALA et al.2001; YIU, 2002). Apesar de os resultados das pesquisas mostrarem a relevância da disfonia associada ao exercício profissional dos professores, na legislação vigente, não há relação do distúrbio de voz com o trabalho. O fato de a disfonia ser um sintoma e não uma doença dificulta a confirmação dessa relação. Na tentativa de superar tal limitação, o 3º Consenso Nacional sobre Voz Profissional (2004) sugere o termo Laringopatias Relacionadas ao Trabalho que constituem um conjunto de doenças que acometem o profissional que utiliza a voz como principal meio para a execução de seu trabalho, sendo que o sintoma clínico principal é a disfonia. Destaca que a doença é considerada ocupacional quando existe relação com o trabalho, mesmo havendo fatores concomitantes não relacionados à atividade laboral. Também ressalta a importância da notificação no SUS e da emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), para fins de registro, mesmo nos casos em que a disfonia não acarrete incapacidade laborativa.

Bibliografia

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CONSENSO NACIONAL SOBRE VOZ PROFISSIONAL, 3, 2004, Rio de Janeiro. Voz e trabalho: uma questão de saúde e direito do trabalhador. Disponível em: < http://www. grupo-ramazzini.med.br/noticiascursos/2004ago14ConsensoVozOcupacional.doc>. Acesso em: 10 set. 2010.

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VILKMAN, E. Voice problems at work: a challenge for occupational safety and health arrangement. Folia Phoniatrica et Logopaedic, Philadelphia,v. 52, p. 120-125, 2000.

YIU, E. M-L. Impact and prevention of voice problems in the teaching profession: embracing the consumer’s view. Journal of Voice, Saint Louis, v. 16, n. 2, p. 215-228, 2002.