DIVERSIDADE SOCIAL
A noção de diversidade tem uma longa história na configuração das ciências sociais. Está associada à construção de explicações científicas sobre os complexos modos de organização dos grupos humanos e ao seu desenvolvimento histórico. O conceito básico constrói-se a partir da antropologia, com a noção de diversidade cultural, à qual se articulam conceitos derivados como os de diversidade étnica, diversidade linguística, diversidade religiosa e diversidade social, entre outros. Também contribuíram as ciências naturais, particularmente a biologia, com o estabelecimento da diversidade das espécies, explicada pela evolução.
Os grandes descobrimentos geográficos realizados durante as expedições iniciadas pelos europeus no século XIII e continuadas até os séculos XV e XVI foram os eventos catalisadores desse processo. O descobrimento dos novos continentes com sua população evidenciou as notáveis diferenças existentes entre os europeus e os nativos das terras descobertas e serviu de base para a construção do conceito de progresso, cunhado pela Ilustração francesa para sustentar a ideia da superioridade do mundo europeu que haveria superado estados de selvageria e barbárie até chegar à civilização. Nesse contexto, a diversidade se ocultava sob uma linha do tempo que mostrava os selvagens como expressão de estados prévios já percorridos pelos europeus. A diversidade se ocultava em estágios sucessivos que mediam fases de uma mesma trajetória que alguns povos tinham conseguido superar, enquanto outros não.
Esse processo se acentuou com a dominação colonial dos séculos posteriores. O regime colonial serviu como método moderno de acumulação originária de capital e como ingrediente ideológico para o ocultamento da diversidade; para consolidar a ideia de um mundo homogêneo no qual a diferença era considerada perigosa e ruim, condição que devia ser superada para a conformação dos modernos estados nacionais. A unidade de credo e de língua, por exemplo, foi considerada condição para a existência desses estágios. O que não se parecesse ao mundo europeu deveria ser considerado inferior e atrasado. Não existia diversidade religiosa, apenas fiéis e infiéis, crentes e hereges; não havia diversidade étnica, mas apenas brancos civilizados e negros e índios selvagens e bárbaros.
Pouco a pouco, a antropologia e outras disciplinas foram avançando na compreensão da complexidade cultural. Introduziram-se noções como a variação cultural, o relativismo cultural, a variação individual, a adaptação cultural, entre outras, e criaram-se orientações teóricas para sua compreensão, algumas das quais chegaram a converter-se em escolas: evolucionismo precoce, particularismo histórico, difusionismo; funcionalismo, estrutural-funcionalismo, cultura e personalidade, evolucionismo tardio, estruturalismo, entre outras. Posteriormente se desenvolveram orientações como a etnociência, a ecologia cultural, a antropologia simbólica e a antropologia cognitiva.
O campo se complexificou tanto que se constituiu o âmbito dos estudos culturais, de caráter interdisciplinar, o qual aborda os temas multiculturalidade, interculturalidade, sociedades e Estados pluriétnicos, entre outros. Nesse processo, outras disciplinas abordaram o tema das diferenças existentes nos e entre os grupos humanos. A sociologia, por exemplo, tratou de maneira precoce o tema da estratificação social. Em debate com a antropologia, falou-se em sociedades igualitárias e sociedades estratificadas, em contraste com a proposta marxista que explicava as desigualdades e as diferenças sociais acudindo ao conceito rigorosamente definido de classes sociais. A análise das castas adicionou um novo elemento a esse processo. A tecnologização eletrônica, as comunicações e as teorias de sistemas, da complexidade e do caos, geraram recentemente programas como os das culturas híbridas, as frentes culturais e as diferentes versões da chamada antropologia pós-moderna.
No entanto, a questão que ainda se faz presente é aquela herdada da construção da modernidade. O colonialismo e a configuração dos estados nacionais atribuíram à educação e à escola um lugar de privilégio em relação ao tratamento da diferença. A educação e a escola se conceberam como fator de homogeneização em contextos de relações de dominação e subordinação. Ambas ocultavam a heterogeneidade e buscavam a homogeneidade. A regra dominou o cenário educativo através da assimilação das práticas eclesiásticas ao mundo educativo. A autoridade e o ensino pautaram os conteúdos e os ritmos da educação. Só de maneira tardia apareceram, por exemplo, as pedagogias que davam conta da complexidade e da diversidade dos sujeitos da educação.
Nesse contexto, a Escola como reguladora de um enfoque de educação para a homogeneidade entra em crise. A diversidade, problema para a unificação do estado nacional, emerge agora como fator de construção de propostas contra-hegemônicas. A crise do modelo capitalista mostrou um extraordinário incremento das desigualdades e da pobreza. As diversidades étnica, linguística e religiosa se somam à complexificação da pobreza e à emergência de novos atores sociais que reivindicam especificidades para sua condição de deslocados pela violência, migração forçada, precariedades relacionadas com a vulnerabilidade de sua condição de pobres que poderiam lançá-los à indigência, exclusões e discriminações no acesso e no uso dos recursos gerados pela produção, reivindicação de identidades sexuais e de gênero não convencionais e, em geral, reivindicações relacionadas com a reação contra a exclusão e com a exigência de reconhecimento e aceitação das diferenças. É a afirmação das identidades o que tem dado visibilidade à diversidade.
Essa nova situação tem convertido a questão da diversidade em objeto de atenção das políticas públicas. No marco das reformas iniciadas em princípios dos anos noventa, sua discussão associou-se a temas como a inclusão, a equidade, o reconhecimento do outro, assuntos que formam parte do debate mais amplo relacionado aos limites e às possibilidades da democracia ou, igualmente, à construção e consolidação de alternativas radicalmente democráticas de poder. Tal é o contexto em que os docentes atuais exercem seu trabalho.