EQUIDADE

Autores/as: ALDAIZA SPOSATI

 

É um princípio da justiça social que supõe o respeito às diferenças como  condição  para se atingir a igualdade. Esse princípio permite demonstrar que igualdade não significa homogeneidade, isto é, o não reconhecimento de diferenças entre as pessoas. Por exemplo, não  se pode pensar que tratar do mesmo modo uma criança, um adulto, ou um idoso seja igualdade. Obter igualdade exige a disposição de  reconhecer o direito de cada um em ter reconhecidas suas necessidades. O direito em ter  diferenças reconhecidas é que constitui a equidade. Por vezes, a noção de universalidade é distorcida por uma leitura imediatista e pragmática que lhe atribui o significado de homogeneidade e não do respeito à heterogeneidade. A noção de equidade se torna mais clara quando analisamos as situações a partir das desigualdades, mediata ou imediatamente vividas. A opressão e subordinação histórica no trato  das mulheres face  aos homens  com certeza exige que a questão de gênero – um aporte de equidade – seja considerada ao tratar dos direitos políticos, humanos ou sociais. A presença dessa  opressão  pode não estar  manifestada imediatamente  na situação em exame, todavia, o fato de ser  historicamente constitutiva   das relações de gênero, ela tem presença  na sociedade de múltiplas formas que trazem dificuldades às mulheres diversas das que sofrem os homens. 

A equidade é parte intrínseca da justiça social. Constitui  um valor ético e civilizatório. A  justiça social é entendida com um corretivo da justiça legal. A etimologia do termo equidade do latim aequitas,atis, um substantivo feminino,  tem o sentido  de igualdade e moderação e o substantivo neutro, aequum, i,  significa equidade e justiça. O sentimento de justiça  supõe  que a análise das situações  inclua outros componentes para  além do estritamente legal. A ausência de equidade provoca a iniquidade, isto é,  inexistência de acesso justo e igual para que todos superem suas necessidades e tenham igualdade  distributiva ou redistributiva na qualidade de atenção a essas necessidades e acesso a oportunidades construídas pela sociedade. Não ter acesso à energia elétrica, à água tratada, ao transporte público são expressões de iniquidade. Portanto, a equidade social significa, nesse âmbito de políticas públicas, um equilíbrio na distribuição de benefícios e acessos construídos  pela sociedade.

No campo da educação, muito se pode reconhecer como  medidas de equidade em busca da igualdade. Mais anos de estudo estão associados a melhores condições de trabalho, melhores condições de vida, melhores posições sociais. Ocorre que o acesso à educação tem sido historicamente, no Brasil,  privilégio dos mais ricos face aos mais pobres, dos meninos às meninas – quadro este em superação pelos últimos dados estatísticos – e, dos brancos aos negros. Medidas para superar essas iniquidades têm sido denominadas de discriminação positiva, isto é, modos de  favorecer o acesso à educação aos que historicamente têm sido discriminados. O acesso ao ensino fundamental já está difundido, todavia  persistem iniquidades como: a diferença de acesso entre a zona  rural  e a urbana; a relação entre condição socioeconômica da família e  o acesso a condições de  permanência da criança na escola (entre as quais  alimentação, material escolar, transporte, uniforme, entre outras). A distância instrucional entre os pais e as crianças, as condições de habitabilidade do local em que vive a criança e suas responsabilidades na família. Pode-se aqui  levantar uma série de outras questões quanto à efetivação da proteção integral preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O direito à  equidade  supõe reconhecer os direitos de cada um, exige estar atento às manifestações de iniquidades. As propostas de discriminação positiva têm sido aplicadas no  acesso ao nível superior  e concretizadas por sistemas de cotas para estudantes afrodescendentes e/ou oriundos de escolas secundárias públicas.

Quando da elaboração do Mapa da Exclusão /Inclusão Social (1996), foi referido como “equidade” o reconhecimento e a efetivação, com igualdade, dos direitos da população, sem restringir o acesso a eles nem estigmatizar as diferenças que conformam os diversos segmentos que a compõem. Assim, equidade é entendida como possibilidade das diferenças a serem manifestadas e respeitadas sem discriminação; condição que favoreça o combate das práticas de subordinação ou de preconceito em relação às diferenças de gênero, políticas, étnicas, religiosas, culturais, de minorias, etc. (SPOSATI, 1996).

Bibliografia

LE GRAND, J. Equity and choice:an essay in economics and applied philosophy. London:Taylor &Francis Books,1991.

LE GRAND, J. The strategy of equility: redistribution and social services. London: George Allen e Unwin, 1982.

PORTO, S. M. Justiça social, equidade e necessidade em saúde. In: PIOLA, S. F.; VIANNA, S. M, (Org.) Economia da saúde: conceito e contribuição para a gestão da saúde. Brasília: IPEA, 1995. p. 123-140.

SPOSATI, A. Exclusão social e fracasso escolar. Em Aberto, Brasília , v. 17, n. 71, p. 21-32, jan, 2000.

SPOSATI, A. (Coord.). Mapa da exclusão/inclusão social de São Paulo. São Paulo: EDUC, 1966.