ESPECIALISTAS DA EDUCAÇÃO
Profissionais que possuíam a função de pensar e decidir sobre as atividades a serem desenvolvidas pelos professores que, muitas vezes, agiam como meros executores. Dentre eles, destacam-se o Administrador Escolar, o Supervisor Escolar e os Orientadores Educacionais que tinham como característica o papel ideológico de controle e de vigilância em suas atividades na Administração Escolar. Essa posição está fundada na organização do trabalho de base taylorista/fordista que deu origem às tendências pedagógicas conservadoras, marcadas pela clara definição de fronteiras entre ações intelectuais e instrumentais (KUENZER apud ARAÚJO, 2007, p. 55). Essa perspectiva compreende a expressão das relações capitalistas e identifica dois segmentos de trabalhadores opostos entre si: os especialistas e os professores. Ou seja, também na escola ocorre a divisão do trabalho pedagógico entre os que pensam e os que fazem. (ARAÚJO, 2007, p. 55). Os especialistas da educação, formados pelas habilitações dos Cursos de Pedagogia, eram os representantes hierárquicos, característicos do período da ditadura militar, marcando a escola pela divisão do trabalho entre eles e os professores. Dentre as funções dos especialistas, cabia ao Administrador Escolar a racionalidade da organização escolar em busca da eficiência, ao Supervisor Escolar coordenar o processo de planejamento, implementação e avaliação curriculares, enquanto que o Orientador Educacional era responsável por levar ao planejamento curricular a realidade do aluno; sendo comum entre eles o controle docente.
Para analisar a problemática do Especialista da Educação, é necessário situá-lo historicamente e explicar que as relações econômicas, sociais e políticas intervêm e determinam a sua natureza. A razão do aparecimento de uma profissão específica como o Especialista da Educação obedece às condições sócio-históricas que estão em estreita conexão com os valores da sociedade onde se originou esse “fenômeno” (ABDULMASSIH; RODRIGUEZ, 2002). Sendo assim, não é possível realizar um estudo do Especialista da Educação separando-o do processo de origem de consolidação do curso de pedagogia que, ao longo de sua existência, passou por várias reformas.
A década de 1930 foi marcada por intensas reformas, entre elas, a implantação do Curso de Pedagogia pelo Decreto-Lei nº. 1.190/39, que organizou a Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, instituindo o chamado “Padrão Federal”, que foi adotado como modelo para os currículos básicos de todos os cursos superiores no país. O licenciado em Pedagogia devia fazer o Curso de Didática que o habilitava para a docência das disciplinas específicas do Curso Normal, como também formava o “técnico em educação”, o equivalente ao Especialista da Educação. Com a expansão da matrícula do ensino primário e do secundário, aumentou a necessidade de mudar o modelo de educação superior. Algumas tentativas de reformulação foram colocadas pela Lei nº 4.024/61, porém não ficou muito claro o posicionamento sobre a formação dos Especialistas da Educação que o sistema educacional brasileiro estava requerendo. Ela previa a formação de professores, orientadores, supervisores e administradores escolares destinados ao ensino primário, através do ensino normal. Em 1966, o Decreto-Lei nº 53 estabeleceu que as Universidades Federais deveriam oferecer cursos de formação de professores para ensino de segundo grau e de Especialistas em Educação. Em 1967, o Decreto-Lei nº 252 explicitava que a formação pedagógica dos Especialistas e dos professores deveria ser ministrada em unidades de ensino profissional e de pesquisa aplicada. Porém acabou dando mais ênfase às normas que norteariam a implantação dos departamentos na nova estrutura universitária. Com a Reforma Universitária da década de 1960, observa-se a reestruturação do Curso de Pedagogia. A Lei nº 5.540/68 estabelecia que a formação dos professores para o ensino de segundo grau, de disciplinas gerais ou técnicas bem como o preparo de especialistas destinados aos trabalhos de planejamento, supervisão, administração, inspeção e orientação no âmbito de escolas e sistemas escolares deveria ser em nível superior. O Especialista poderia exercer atividades tais como: magistério da escola primária (atividade exercida desde o início do Curso de Pedagogia); atividades referentes a cada especialidade (habilitação); magistério do ensino normal. Segundo Soares, citado por Abdulmassih e Rodriguez (2002, p.5), a experiência em magistério, para os habilitados em Orientação Educacional, Supervisão Escolar e Administração Escolar, só foi definida em 1972, através do Parecer nº 867, segundo o qual a experiência em magistério anterior ao ingresso no curso ou à obtenção do diploma não poderia ser inferior a um ano para a habilitação Orientação Educacional e um semestre letivo para as demais habilitações, o que acentuou a divisão do trabalho escolar fragmentando as tarefas dos profissionais na escola, seguindo o modelo taylorista implantado nas fábricas. Por outro lado, a imposição desse modelo tecnicista contribuiu para desintegrar o trabalho pedagógico e aprofundou os embates entre os especialistas e professores no interior da escola. O fato de os Especialistas, sem ter uma formação apropriada, desempenharem funções supervalorizadas dentro da hierarquia escolar e ainda receberem remunerações superiores às dos professores propiciou ações de caráter corporativas entre eles.
Desde a implantação da figura do Especialista da Educação, foi instalada a fragmentação tanto na formação inicial dos educadores quanto do trabalho educativo no interior da escola. O curso de Pedagogia, através do modelo pedagógico em habilitações, contribuiu para suprimir da formação do educador o caráter totalizador da ação educativa, dado que a formação do professor e do especialista recebia um tratamento diferenciado, distanciando este último da função docente. Assim, o Especialista da Educação, com um saber limitado, passou a ser um dos sujeitos determinantes, dado que era quem operacionalizava, no interior das escolas, a ideologia dominante, especialmente através dos currículos, especialmente como consequência da Lei nº 5.692/71 (ABDULMASSIH; RODRIGUEZ, 2002). Tal lei determinou que a formação dos especialistas da educação seria feita em curso superior de graduação com duração plena ou curta, ou de pós-graduação. Além disso, reforçou a obrigatoriedade da presença dos Especialistas nos estabelecimentos de ensino que, por sua vez, respondendo aos interesses econômicos da época, passaram a promover as condições necessárias de implantação do controle do ensino, nos diversos setores do sistema educacional. Apesar da grande repressão implantada pelo regime militar, a classe trabalhadora ameaçada começou a organizar-se através dos sindicatos e associações que foram fortalecendo as lutas sociais. Os educadores, através de suas associações, promoveram vários eventos na busca de reconquistar a sua identidade. Eles criticavam o lugar dos especialistas no trabalho da escola, levando-se em consideração a fragmentação, a hierarquia, a expropriação do saber do professor e a divisão entre a concepção e a execução. Nesse momento, acreditava-se que esses profissionais pouco contribuíam para a qualificação do professor, cooperando minimamente para a melhoria significativa do ensino. Esse período também foi marcado pela intensificação da organização dos especialistas, em associações de classes, envolvendo milhares de profissionais da área em defesa de seus interesses corporativos.
Na década de 1990, o debate a respeito dos cursos de pedagogia foi retomado e a Lei nº 9.394/96 estabeleceu que a formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação para a educação básica seria feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nessa forma, a base comum nacional. Além disso, determinou que a formação deveria abranger de modo integrado à docência a participação da gestão e avaliação de sistemas e instituições de ensino em geral, a elaboração, a execução, o acompanhamento de programas e as atividades educativas. Portanto, busca superar a dicotomia entre o pensar e o executar, ou seja, entre os especialistas e o docente, predominante ao longo dos anos, no curso de Pedagogia, como reflexo da divisão técnica das tarefas e da fragmentação do trabalho pedagógico. Segundo Araújo (2007), tem-se legalmente hoje a possibilidade de o docente controlar seu trabalho e seu produto, de criar seu saber, de buscar a função social da escola onde ele atua.