GOVERNABILIDADE
Atributo das sociedades que podem ser consideradas como sendo mais ou menos governáveis. Nas primeiras, o Estado é uma instituição que, no exercício de suas funções governamentais, exibe um grau de eficácia superior àquele observado naquelas circunstâncias em que a instituição estatal procura afirmar-se em um contexto marcado pela existência de uma sociedade menos governável. Assim, a problemática dos graus de governabilidade das sociedades remete às condições sistêmicas de exercício do poder político do Estado, envolvendo a consideração das capacidades das instituições e atores governamentais e das demandas (distribuição de bens e serviços; produção de normas; direitos de participação; etc.) e apoios (recolhimento de tributos; aquiescência às normas; participação política; etc.) provenientes das instituições e atores do sistema político em geral.
Em uma concepção sistêmica, as instituições governamentais devem processar e converter diferentes tipos de insumos (demandas e apoios) em decisões políticas, sendo que, como parte integrante do sistema político, as instituições governamentais são influenciadas por e influenciam outras instituições e atores políticos.
O aspecto central da questão da governabilidade em nossas sociedades diz respeito a uma análise das articulações entre Estado e sociedade que contemple a operação das instituições estatais de maneira que o Estado seja visto não apenas como um instrumento de produção de decisões e realização de certos fins, mas também uma arena no âmbito da qual diferentes atores pugnam por representação em suas instâncias decisórias visando o atendimento de seus interesses.
A questão da governabilidade envolve então, por um lado, o fortalecimento das capacidades estatais, buscando-se o aperfeiçoamento das instituições governamentais capaz de permitir-lhes que persigam e atinjam a realização de determinados fins. Por outro lado, no contexto de sociedades democráticas, cabe reconhecer no Estado uma instituição na qual estejam representados diferentes interesses que participam dos processos de fixação dos fins da ação do Estado por meio de procedimentos percebidos como legítimos pelo maior número possível de portadores de diferentes interesses.
Daí poder-se afirmar que serão mais governáveis aquelas sociedades nas quais as instituições governamentais estejam mais bem aparelhadas para promover a conversão de demandas e apoios em decisões que contemplem o maior número possível daqueles interesses personificados pelos diferentes atores políticos.
O marco inicial da emergência do tema da governabilidade dos sistemas democráticos foi uma mudança conservadora nos anos 1960 que abalou o otimismo que permeava a literatura sobre modernização e desenvolvimento político no tocante a uma suposta associação entre os fenômenos do desenvolvimento econômico e da construção de instituições democráticas. Diagnosticada uma crise da democracia tanto nos países industrializados quanto nos países periféricos, o foco das preocupações de diversos analistas políticos desloca-se da problemática da construção de sistemas democráticos para a busca da estabilidade política ou da governabilidade dos sistemas políticos. Diante de uma sobrecarga do Estado provocada pela saturação da agenda pública por uma inflação de demandas provenientes da sociedade, a superação do baixo rendimento dos sistemas democráticos implicaria na adoção de medidas de contenção daquelas demandas consideradas excessivas, vocalizadas por certos atores políticos, e de restrição da intervenção governamental em certas áreas de políticas.
Contudo, ainda que seja um atributo das sociedades, o termo governabilidade vem sendo utilizado pelo menos desde os anos 1980 com ênfase na capacidade estatal para governar. Perspectiva que implica em limitar os desafios de alcançar e preservar a governabilidade a um trabalho de engenharia institucional voltado para a reforma das instituições estatais. Daí a enumeração de uma série de dispositivos institucionais estatais que interferem na capacidade dos governos de produzirem e implementarem suas decisões. Assim, no cenário latino-americano, o tema da governabilidade de seus sistemas políticos tem sido abordado a partir de questões tais como: forma de Estado (unitarismo x federalismo); centralização x descentralização dos processos decisórios; sistema de governo (presidencialismo x parlamentarismo); sistema eleitoral (proporcional x majoritário); sistema partidário (padrão bipartidário x multipartidário); relações entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; Legislativos unicamerais x bicamerais; mudança constitucional; sistema de intermediação de interesses; caráter majoritário x consociativo dos arranjos institucionais e mecanismos de participação popular.
EDUARDO MEIRA ZAULI