REGULAÇÃO

Autores/as: CLAUDE LESSARD

O termo regulação, atualmente em moda no campo da educação, mas utilizado há muito tempo em diversas disciplinas – biologia, economia, sociologia, psicologia, pedagogia, etc. – é polissêmico. Ele remete à busca do equilíbrio em um sistema de ação em movimento; às necessárias adaptações desse sistema, muitas vezes perturbador (ideia de homeostasia); a mecanismos de redução da variabilidade dos movimentos ou de correção de distanciamentos em relação a uma norma ou regra estabelecida; ao jogo de forças divergentes que se encontram e cujo choque acarreta, em certas condições, o estabelecimento de um compromisso viável e apto a ser reproduzido; à pressão exercida sobre indivíduos ou sobre unidades para que uma certa conformidade dos comportamentos se mantenha e se estabilize.

Dupriez e Maroy (1999) adotam três acepções: 1) a regulação “sistêmica” compreende as ações ou retroações que contribuem para manter um sistema em equilíbrio e assegurar seu funcionamento correto; 2) a regulação « institucional ou política » remete ao conjunto das regras, convenções e mecanismos de controle implantados por uma autoridade reconhecida para orientar as ações de atores sobre os quais ela tem certa autoridade e 3) a regulação como “ação” de produção de regras do jogo em um determinado campo de ação (perspectiva construtivista).

Para Durkheim, que está próximo da primeira acepção, a regulação é consensual, já que as normas têm origem em valores comuns, sendo elas mesmas expressão da consciência coletiva. O controle social assegura sua manutenção e luta contra seus desvios. Esse é o ponto de vista da tradição funcionalista. A segunda concepção da regulação está associada aos trabalhos de Reynaud (1988), às duas formas de regulação que ele identificou (regulação formal, também chamada regulação de controle, e regulação informal, ou autônoma) e à ideia de uma regulação efetiva de uma organização, fruto do encontro dessas duas regulações, entre o trabalho prescrito e o trabalho real, entre a autonomia reivindicada pelos trabalhadores e o controle imposto pela hierarquia. Essa regulação efetiva seria conjunta e a regra comum, assim construída, fruto de uma negociação entre dois grupos com interesses divergentes. No centro das relações sociais de trabalho, essa regulação conjunta é, então, um espaço de luta pelo controle do trabalho.

Dessa forma, em torno do conceito de regulação, questões fundamentais como a da construção da regra, sua imposição ou sua negociação, a da variabilidade, do desvio ou da mudança, a do consenso ou do conflito em torno da regra e a da eficácia ou da legitimidade da ação e de sua coordenação são colocadas e problematizadas em função das características de um dado campo e do contexto no qual ele evolui.

Em educação, distingue-se uma regulação tradicional, chamada de burocrático-profissional, de uma nova regulação, chamada de “pós-burocrática”.

A regulação tradicional é contemporânea da construção dos sistemas de educação democráticos e de massa. Com efeito, considerando-se as legislações referentes à obrigatoriedade escolar e para responder ao crescimento autônomo da demanda por instrução pública, os Estados desenvolveram verdadeiros sistemas de educação, compreendendo grandes organizações, que foi preciso estruturar de acordo com os princípios de gestão dominantes na época, ou seja, aqueles de uma burocracia “racional-legal” (Weber). Ao mesmo tempo, reconhecendo que o trabalho que ali se realizava dependia de um pessoal especializado, uma gestão de pessoal teoricamente respeitosa da autonomia e competência dos professores se institucionalizou e colocou a ênfase principalmente no aumento da formação dos professores. É verdade que havia nesses dois princípios, o da regra burocrática e o da autonomia profissional baseada na competência, uma fonte de tensão e de conflitos que não deixaram de marcar a história da escola moderna de massa. Entretanto, como a escola moderna repousa sobre uma forma escolar fortemente legitimada, ancorada em representações da “verdadeira escola” e do “dar aula”, e que os professores são antigos alunos que interiorizaram fortemente essa forma escolar, os conflitos entre os dois princípios tiveram tendência a ser bastante contidos, salvo exceção. Na verdade, nem a regulação burocrática, nem a regulação profissional foram historicamente muito fortes e muito determinantes do trabalho realmente realizado pelos professores, e o sistema pôde se manter graças à forte interiorização/socialização dos professores da forma escolar histórica.

A nova regulação se distancia dessa regulação tradicional. Objeto de uma política explícita na maior parte dos países ocidentais ditos desenvolvidos e imposta pelas organizações internacionais aos países que elas pretendem “ajudar”, a nova regulação da educação se caracteriza pela combinação de elementos que, juntos, determinam a passagem: 1) de um domínio da oferta de educação ao da demanda; 2) de um controle burocrático dos processos a uma prestação de contas explícita, referente aos resultados (sobretudo quantitativos); 3) de uma prioridade concedida à acessibilidade à da qualidade (mais ou menos diferenciada); 4) de um sistema de autoridade unívoca (centralizado ou descentralizado) a recomposições dessas dimensões (acentuando algumas vezes as duas, mas em relação a objetos diferentes); 5) do paradigma do ensino ao paradigma da aprendizagem, o que tentam exprimir os currículos conhecidos como currículos por competências (LESSARD, 2000).

A nova regulação se propõe a ir além da antiga. Na verdade, se a antiga buscava garantir a conformidade a regras burocráticas e a normas profissionais, se ela se preocupava principalmente em fazer “andar” o sistema, zoneando os campos de aplicação do controle burocrático e de sua contrapartida profissional e encontrando compromissos viáveis entre as duas, quando necessário, a nova regulação tem uma concepção mais dinâmica do controle. Preocupando-se menos com a conformidade e a continuidade, imbricada na cultura atual do desempenho, da eficácia e da produtividade, ela se propõe a “movimentar” o sistema. Isso significa colocar em marcha, animar, pilotar, regular um processo para que ele complete seu ciclo, para que ele seja fiel a seu objetivo inicial e que dê os frutos esperados. Isso passa pela ativação de duas alavancas: a primeira é sustentada pela hierarquia burocrática: é a alavanca da avaliação, da prestação de contas e da imputabilidade. A segunda alavanca é a da abertura do espaço educativo local para a concorrência entre os estabelecimentos, que criam leis e regras administrativas que facilitam o exercício do direito dos pais de escolher a escola de seus filhos.

A nova regulação, também chamada pós-burocrática, intensifica essas duas modalidades de controle, uma delas vertical, a da avaliação e da imputabilidade, e a outra, mais horizontal, associada ao poder dos pais usuários e à liberdade de escolha.

A nova regulação não faz desaparecer a antiga: o poder hierárquico e a referência profissional permanecem presentes, mas devem combinar-se com novos princípios (a eficácia pela prestação de contas, a concorrência e o poder dos usuários) e de novos atores da ação pública. Essa multirregulação produzirá ordem ou desordem, qualidade e eficácia ou, ao contrário, iniquidade e ineficiência? Uma verdadeira questão a que estudos nacionais e comparativos deveriam permitir responder.

Bibliografia

DUPRIEZ, V.; MAROY, C. Politiques scolaires et coordination de l’action. Louvain, UCL/GIRSEF, 1999.

LESSARD, C. Évolution du métier d’enseignant et nouvelle régulation de l’éducation. Recherche et Formation, Lyon, n. 35, p. 91-116, 2000.

MAROY, C. École, régulation, et marché:une comparaison de six espaces européens. Paris, PUF, 2006. (Col. Éducation et société).

REYNAULT, J.-D. Les régulations dans les organisations : régulation de contrôle et régulation autonome. Revue Française de Sociologie, Paris, v.29, p. 5-18, 1988.