SINDICALISMO DOCENTE
Associação de caráter voluntário, sem fins lucrativos, cujo objetivo é organizar e representar o professorado (sócios e não-sócios) na defesa de interesses individuais e coletivos, particularmente quanto à melhoria das condições e valor do trabalho e das condições de ensino, mas também em relação à implantação de políticas educacionais (com suas consequências para a organização do trabalho e a qualidade da educação). Internacionalmente a maior parte do professorado está sindicalizada, se bem que existam também conselhos profissionais docentes, que são associações de pertencimento obrigatório para o exercício da profissão, semelhantes aos conselhos das profissões liberais. Em teoria, tal dualidade de representação pode indicar o grau de aproximação ao caráter profissional ou proletário do trabalho docente, pois se os sindicatos são a expressão da posição e consciência de classe dos trabalhadores manuais e as associações são organizações de classe média que encarnam a consciência de status (GUERRERO SERÓN, 1993, p. 22), conhecer onde o professorado se organiza pode esclarecer traços de sua identidade, bem como de sua situação na estrutura social e na ocupacional.
Contudo, essa divisão é principalmente didática, pois o estudo das formas de organização do professorado indica grande variedade de características, que ademais têm se modificado no transcorrer dos tempos. Assim, podemos dizer que as diferentes organizações encontram-se tensionadas por uma lógica dual: a defesa dos direitos trabalhistas de seus afiliados (dimensão sindical) e o compromisso com a qualidade da educação, especialmente enquanto serviço público (dimensão profissional) (IBARROLA; LOYO, 2001).
Em relação ao seu surgimento e consolidação, se os sindicatos de trabalhadores desenvolvem-se com a constituição do operariado durante o processo de expansão do capitalismo industrial na Europa (CATTANI, 1997), os sindicatos docentes aparecem tardiamente, em virtude das particularidades do grupo profissional. Os docentes só se tornam uma categoria com as transformações que os conduziram a funcionários de Estado, quando da criação e expansão dos sistemas escolares massivos, a partir do final do séc. XVIII. Paulatinamente, a consolidação desse grupo faz surgir organizações representativas entre o fim do século XIX e o início do XX, igualmente no plano europeu (NÓVOA, 1991).
Na América Latina (TIRAMONTI, 2001), esse surgimento pode ser associado aos processos de modernização de cada país – o que inclui o desenvolvimento dos sistemas educativos, os modelos de acumulação, as necessidades de ampliação da base social do Estado e os regimes políticos adotados. Podemos dizer que Argentina, Chile e México são países de modernização precoce (modelo inclusivo de diferentes setores sociais). Nestes, o corpo docente e os movimentos de professores organizaram-se cedo, participando da conformação das ideologias pedagógicas e das identidades docentes. Em países de modernização tardia (nos quais determinados setores sociais não foram incorporados ao mercado e à participação política), as organizações sindicais e o próprio corpo docente demoram mais a constituir-se (casos da Colômbia, Brasil, República Dominicana, El Salvador, Venezuela, Costa Rica e Guatemala). Quanto à articulação entre sindicatos e poder político (interferência do Estado ou de partidos na criação das organizações), há países (1) onde há continuidade entre direções partidárias e sindicais (Venezuela, Costa Rica, México, República Dominicana e El Salvador); (2) onde houve a incorporação dos sindicatos à estrutura de governo do sistema educativo, mas com algum grau de autonomia casos do Chile, Argentina e Colômbia; (3) nos quais os sindicatos docentes se mantiveram distanciados da tutela do Estado e/ou dos partidos, constituindo-se, mesmo, como oposição ao Estado (Brasil e Guatemala).
Outros traços das organizações latino-americanas (IBARROLA; LOYO, 2001): estão formadas majoritariamente por docentes de escolas públicas. Defendem o direito de associação e de livre afiliação, mesmo que tenham que observar limitações jurídicas às suas atividades (como greves). Reivindicam autonomia – embora muitas se aproximem das perspectivas de algum partido político -, financiando suas ações com cotas de seus afiliados; e se regem por estatutos com normas democráticas de funcionamento, em especial quanto à eleição de dirigentes. Mesmo associadas à Confederação de Educadores Americanos e à Internacional da Educação, sua articulação internacional parece ter caráter mais formal. Para adquirir força, há muitas estratégias. Há países em que várias entidades não integradas caracterizam um quadro de fragmentação (Guatemala e Costa Rica), ou em que há múltiplas federações (Venezuela). Em outros, encontramos os sindicatos integrados em confederações (Argentina e Brasil). México e República Dominicana têm associações ou sindicatos nacionais praticamente únicos, enquanto Colômbia e Chile agrupam numa única federação as associações e sindicatos existentes.
No Brasil, desde o final do século XIX, encontramos associações (não sindicais) docentes, mais bem estruturadas a partir da organização das redes de ensino público (anos 1930 em diante). A sindicalização propriamente dita radicaliza-se na transição democrática ocorrida durante a última ditadura militar, principalmente porque, sendo a maioria do professorado composta pelo funcionalismo público, este esteve impedido de criar sindicatos até o término da ditadura (1985) e a promulgação da Constituição de 1988. Contudo, mesmo não podendo instituir-se como sindicatos, muitas dessas associações atuavam como tal, na redemocratização da sociedade e em suas reivindicações corporativas. Emblemáticas, então, do sindicalismo especialmente do professorado público, são as mobilizações massivas, típicas do sindicalismo combativo; a organização pela base, isto é, por local de trabalho (escola) e região, representando-se finalmente em organizações regionais; a paulatina identificação com o novo sindicalismo, por meio da filiação das entidades à CUT (Central Única dos Trabalhadores); e a posterior unificação de docentes e funcionários de escolas em entidades únicas, no que tange ao ensino básico. Nesse caso e atualmente, quem congrega nacionalmente as demais entidades regionalizadas é a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), originada da CPPB (Confederação dos Professores Primários do Brasil).