SINDICATOS NA AMÉRICA LATINA
O sindicato é uma instituição sociopolítica que representa os interesses dos trabalhadores nas empresas, na sociedade e na política (GODIO, 1983). As primeiras organizações sindicais surgiram na Europa ocidental e nos Estados Unidos entre o final do século XVIII e começo do século XIX como reação ante o desenvolvimento do sistema fabril. Na América Latina, os sindicatos começaram a conformar-se no último terço do século XIX, primeiro na Argentina e no Uruguai e, mais tarde, no Chile e em outros países, sob a forma de cooperativas ou mutualismo e com a organização de sindicatos de artesãos e trabalhadores de pequenas atividades industriais (tipógrafos, padeiros, alfaiates, sapateiros).
Entre o final do século XIX e o começo do século XX, as ondas imigratórias europeias que garantiram a oferta de trabalho nos países de industrialização mais precoce introduziram também sistemas de ideias centralmente, o anarquismo e o socialismo- que fomentaram a organização operária (GONZÁLEZ CASANOVA, 1985). Ao mesmo tempo, o desenvolvimento das atividades produtivas orientadas ao mercado mundial impulsionou o crescimento do proletariado urbano e o desenvolvimento da organização sindical. A maior parte dos governos e dos empregadores resistiram e reprimiram as primeiras formas de organização operária por medo de seus efeitos no mercado de trabalho e por significarem uma potencial ameaça à propriedade privada e à ordem política oligárquica. Com o fim da Primeira Guerra Mundial, produziu-se o auge dos sindicatos anarquistas em toda a região, que se expressou em massivas greves gerais brutalmente reprimidas exigindo oito horas de trabalho, melhoria dos salários e das condições de trabalho e de vida (ZUBILLAGA, 1989). Na década de 1920, o sindicalismo anarquista perdeu posições diante da ascensão dos sindicatos comunistas, organizados em torno da Terceira Internacional.
Com a Grande Depressão, os governos latino-americanos começaram a implementar medidas protecionistas que facilitaram a industrialização doméstica. Em um contexto caracterizado pela crise da dominação oligárquica, economias mais fechadas e intervenção estatal, a possibilidade de uso de estratégias políticas por parte dos sindicatos fortaleceu-se. A expansão do direito ao sufrágio universal masculino gerou novas opções para os trabalhadores e a preocupação pela questão social levou diversos governos a promover a institucionalização das relações laborais. Alguns grupos governantes perceberam os sindicatos como um dos poucos grupos organizados em sociedades civis fracas e suas reações diante do movimento sindical oscilaram entre a cooptação político-eleitoral e a repressão (MURILLO, 2001).
Nas décadas de 1930 e 1940, conformaram-se dois tipos de sindicatos na América Latina: o classista e o corporativista. O sindicalismo classista, influenciado ideologicamente pelo marxismo-leninismo e o trotskismo, predominou no Uruguai, no Chile, na Bolívia e, em menor medida, na Colômbia, no Peru e no Equador. O sindicalismo corporativista dominou em geral no México, na Venezuela, no Brasil (antes da CUT), na Argentina e no Paraguai. Associado com os regimes populistas e com os projetos desenvolvimentistas, o sindicalismo corporativista fez parte do processo de institucionalização do conflito interclassista, que implicou uma forte subordinação dos sindicatos ao Estado. Durante os anos da larga expansão (1945-1975), as grandes organizações sindicais de trabalhadores do Estado (administração pública, saúde, educação) e das grandes empresas do setor público e privado (petróleo e mineração, metalurgia, metal-mecânica, transportes, bancos, telecomunicações) adquiriram uma forte influência política. Ao mesmo tempo em que se conformavam os sistemas de segurança social e se impunham dispositivos de monopolização da representação sindical, os trabalhadores urbanos sindicalizados obtiveram importantes benefícios e melhoras salariais (CUEVAS, 1990). No entanto, nos países com economias menos diversificadas, as relações entre sindicatos e Estado mantiveram, em muitos aspectos, um caráter tradicional e patrimonial.
Os
processos de democratização da década de 1980 e as políticas neoliberais da
década de 1990 modificaram profundamente o marco de ação dos sindicatos
latino-americanos. Com o final da etapa de expansão iniciada no pós-guerra e a crise fiscal, a maior parte dos
países da região começaram a abrir suas economias e a reduzir seus aparelhos
estatais através da privatização, da desregulamentação
e da descentralização dofornecimento de serviços sociais. As transições
duais (MURILLO, 2001) em direção a sistemas políticos e
economias mais abertas geraram condições que tornaram menos efetivas as
tradicionais estratégias políticas dos sindicatos. O peso do sindicalismo na política
eleitoral e seu controle sobre as políticas públicas diminuíram. Os sindicatos
classistas, disciplinados pela hiperinflação, assimilaram as reformas
neoliberais (Chile, Bolívia) ou resistiram e foram derrotados e deslegitimados
(Uruguai, Brasil). Os sindicatos corporativos tentaram se adaptar às novas
condições e conservar a aliança com o novo estado neoliberal, como no México,
na Venezuela ou na Argentina
(GARZA
TOLEDO, 2000).
No começo do século XXI, os trabalhadores latino-americanos encontram maior liberdade para se organizar nas novas democracias, mas enfrentam os desafios criados pela maior mobilidade do capital, a liberalização econômica e as mudanças nos mercados de trabalho. A globalização econômica aprofundou as diferenças entre trabalhadores, especialmente entre aqueles de setores comercializáveis e não comercializáveis e os de empresas com diferentes capacidades competitivas. Esse forte incremento da heterogeneidade dos mercados laborais dificulta a solidariedade horizontal e a organização dos trabalhadores. Visando melhores salários e condições de trabalho para seus membros, os sindicatos da região se veem diante da necessidade de modificar suas estratégias para lidar com novos problemas em contextos mais complexos e competitivos. No entanto, a consolidação da democracia política, uma nova etapa de crescimento econômico e o estabelecimento de diversas alianças com outros movimentos e setores sociais em diversos cenários locais, nacionais e internacionais têm permitido aos sindicatos latino-americanos reconstruir sua posição como atores sociais e políticos relevantes.