SISTEMAS EDUCACIONAIS
São organizações complexas, instaladas nos diferentes países, com o propósito de articular as diversas atividades voltadas para a realização dos objetivos educativos das respectivas populações. Implicam, por via de regra, três elementos: a) um conjunto de princípios, valores e finalidades que devem guiar as atividades desenvolvidas; b) um ordenamento jurídico constituído pelas normas de funcionamento do sistema que obrigam a todos os seus integrantes; c) uma rede de estabelecimentos de ensino com os correspondentes órgãos de normatização, administração, controle, coordenação, supervisão e avaliação.
Considerando-se que sistema é a unidade de vários elementos intencionalmente reunidos de modo a formar um conjunto coerente e operante, segue-se que o sistema educacional é a unidade dos vários organismos e serviços educacionais intencionalmente reunidos de modo a formar um conjunto coerente que opera eficazmente no processo educativo da população a que se destina.
No desenvolvimento da sociedade moderna, a educação passou do ensino individual no espaço doméstico a cargo de preceptores privados para o ensino coletivo ministrado em espaços públicos denominados escolas. Assim, a educação sistematizada própria das instituições escolares tendeu a se generalizar impondo a exigência de se sistematizar também o funcionamento dessas instituições dando origem aos sistemas educacionais organizados pelo poder público. Nessas condições, a partir da segunda metade do século XIX, a consolidação dos Estados nacionais se fez acompanhar da implantação dos sistemas nacionais de ensino nos diferentes países.
Esse fenômeno generalizou, na educação, o uso do termo sistema como uma espécie de termo primitivo não carecendo, pois, de definição, o que lhe conferiu caráter polissêmico, prenhe de imprecisões. Impõe-se, pois, depurá-lo de suas ambiguidades, já que o termo sistema se aplica frequentemente não ao sistema propriamente dito, mas às suas partes. Daí expressões como sistema de ensino fundamental, sistema de ensino médio, sistema de ensino profissional, sistema escolar, sistema estadual, municipal ou federal de ensino, sistema de ensino industrial, etc. como se fossem coisas diferentes, quando são apenas partes do mesmo sistema educacional.
São frequentes, ainda, expressões como sistema público de ensino, sistema particular de ensino e sistema livre de ensino. A primeira expressão é pleonástica porque o sistema só pode ser público já que implica normas próprias. E somente o Estado tem a prerrogativa de definir normas que obrigam a todos. Disso resulta que a segunda expressão é contraditória, pois os particulares não podem emitir tais normas; logo, não pode haver sistema particular de educação. Finalmente, a terceira expressão não faz sentido, pois o ensino livre é tal exatamente porque não segue as normas do sistema; logo, está fora dele.
A palavra sistema assume, também, no uso corrente, a conotação de modo de proceder, de forma de organização, o que remete ao aspecto do método. Assim, é comum alguém dizer para outra pessoa: meu sistema é diferente do seu. Emblemático desse uso corrente é o verbo italiano sistemare que significa arrumar, pôr as coisas em ordem, ordenar elementos formando um conjunto.
Em educação também é frequente o uso do termo sistema para designar determinados procedimentos metodológicos ou didáticos. Daí aparecer, no nível da teoria pedagógica, expressões como Sistema Decroly, Sistema Montessori, Sistema Winnetka, transladando-se para o plano da forma de funcionamento do ensino em determinadas empresas educacionais que criam pacotes sob o nome de sistema. Daí, as denominações Sistema COC, Sistema Anglo, Sistema Uno de Ensino, etc. Evidentemente, a noção de sistema educacional tem um significado bem mais abrangente do que esses usos que a palavra sistema sugerem.
O termo estrutura, como sistema, refere-se a conjunto de elementos; por isso, muitas vezes, ambos são usados como sinônimos. Para evitar ambiguidades, cumpre distingui-los.
Estrutura implica a própria textura da realidade; indica a forma como as coisas se entrelaçam entre si, independentemente do homem e, às vezes, envolvendo o homem (como no caso das estruturas sociais, políticas, econômicas, educacionais). Sistema, em contrapartida, implica uma ordem que o homem impõe à realidade. O homem sofre a ação das estruturas, mas, na medida em que toma consciência dessa ação, ele é capaz de manipular a sua força agindo sobre a estrutura e lhe atribuindo um sentido.
Parafraseando um dito de Sartre (1968, p. 117), dir-se-ia: o que foi feito do homem são as estruturas; o que ele faz (daquilo que fizeram dele) é o sistema.
Portanto, enquanto estrutura implica inintencionalidade, sistema implica intencionalidade. É, pois, um produto da práxis intencional coletiva. Práxis (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 1975) é entendida aqui como uma atividade humana prática fundamentada teoricamente. O produto intencional e concreto de uma práxis intencional coletiva, eis o que é o sistema.
Uma vez que o sistema educacional se configura como uma organização objetiva, ele possui uma estrutura. Dir-se-ia que, enquanto a estrutura se apresenta como um sistema que o homem não fez ou fez sem o saber, o sistema pode ser comparado a uma estrutura que o homem faz e sabe que o faz. Note-se que, no segundo caso, o verbo foi utilizado no presente e não foi por acaso; é preciso atuar de modo sistematizado no sistema educacional; caso contrário, ele tenderá a distanciar-se dos objetivos humanos caracterizando-se, agora sim, especificamente como estrutura (resultado coletivo inintencional de práxis intencionais individuais).
Não dispomos de muitos estudos sobre a conceituação de sistema educacional. No Brasil, podemos destacar o debate entre Capanema (1949) e Almeida Júnior (1949). Além da tese sobre o conceito de sistema na LDB de 1961, defendida em 1971, (SAVIANI, 2008) e do estudo elaborado em 1972 por Esther de Figueiredo Ferraz (1984), temos o texto divulgado pelo INEP-MEC (CURY; SAVIANI; ABICALIL, 2009). Já no que se refere aos sistemas nacionais de ensino, a literatura é mais ampla, consubstanciada nos estudos de educação comparada como podemos constatar, no Brasil, pelas publicações de Milton da Silva Rodrigues (1938), Kandel (1947), Lourenço Filho (1961) e Nicholas Hans (1971).