TRABALHO DOCENTE HOSPITALAR
O ambiente hospitalar, até pouco tempo atrás, era organizado para propiciar cuidado, isolamento, discrição e silêncio para com seus enfermos. No entanto, temos assistido a um reordenamento desse espaço à medida que são inseridos profissionais de diversas áreas no ambiente hospitalar, com a finalidade de propiciar o cuidado e a atenção integral ao enfermo, e especialmente à criança hospitalizada (PAULA, 2007).
As crianças e os adolescentes hospitalizados, independentemente da patologia que possuem, são considerados alunos temporários de educação especial por se acharem afastados do universo escolar, privados da interação social propiciada na vida cotidiana e por terem pouco acesso aos bens culturais, como revistas, livros, atividades artístico-culturais nesses ambientes. Logo, correm um risco maior de reprovação e evasão, podendo configurar um quadro de fracasso escolar.
A atuação docente em ambiente hospitalar aproveita qualquer experiência, por dolorosa que possa ser, para enriquecer e mudar o sofrimento em aprendizagem. Essa atuação, de acordo com Simancas e Lorente (1990), dá-se sob três principais atividades:
a) Área de Atividade Escolar: de maneira geral, a grande maioria das crianças hospitalizadas encontra-se em idade escolar e, por isso mesmo, a ação pedagógica pretende diminuir o prejuízo causado por essa interrupção, normalmente brusca e inesperada.
b) Área de Atividade Recreativa: tal como a atividade escolar, a atividade recreativa supõe um fim educativo. Constitui-se de atividades que se propõem ao entretenimento em seu sentido mais profundo, proporcionando alegria, distração, relaxamento das tensões e fomentando o convívio entre as crianças hospitalizadas.
c) Área de Atividade de Orientação: essa área de atuação foge de toda e qualquer organização. Consiste, principalmente, em fazer companhia, escutar, estabelecer uma relação afetuosa com o enfermo, no sentido de permitir uma ressignificação desse espaço permeado de insegurança, medo e dor.
Dentre essas áreas do trabalho pedagógico nos hospitais, destacam-se as Classes Hospitalares, as quais, por sua vez, constituem-se em modalidade educacional que visa a atender pedagógica e emocionalmente as crianças e os adolescentes hospitalizados. Fonseca (2001, p. 47) define essa modalidade de trabalho docente como um espaço em que o tempo de aprender é o tempo do aluno […] a sala de aula é do tamanho do mundo, no caso da sala de aula da classe hospitalar, serve como mediadora à possibilidade da criança de plugar-se com o mundo fora do hospital.
Vários autores posicionam-se favoravelmente às atividades pedagógicas desenvolvidas no hospital, dentre eles, Silva que assim argumenta em favor desse trabalho: […] estas atividades objetivam minimizar os efeitos da hospitalização[…], a possibilidade da criança estudar no hospital evita a defasagem de conteúdos e uma possível exclusão escolar . (SILVA, 2001, p.43-44).
A legislação brasileira reconhece o direito de crianças e adolescentes hospitalizados ao acompanhamento pedagógico-educacional (Política Nacional de Educação Especial) (BRASIL, 1994). Estabelece que a educação em hospital seja realizada através da organização de classes hospitalares, as quais devem assegurar sua oferta educacional.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional assegura que, para garantir o cumprimento da obrigatoriedade de ensino, o Poder Público criará formas alternativas de acesso aos diferentes níveis de ensino (Art. 5, § 5), podendo organizar-se de diferentes formas para garantir o processo de aprendizagem (BRASIL, 1996, Art. 23). Dentre as situações que exigem formas alternativas de acesso e organização do ensino, estão aquelas que caracterizam educação especial.
Para atuar em Classes Hospitalares, o professor deverá estar habilitado para trabalhar com a diversidade humana e com diferentes experiências culturais, identificando as necessidades educacionais especiais dos educandos impedidos de frequentar a escola, decidindo e inserindo modificações e adaptações curriculares em um processo flexibilizador de ensino/aprendizagem. O documento do Ministério da Educação, intitulado Classe hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações, preconiza que o professor:
[…] deverá ter a formação pedagógica preferencialmente em Educação Especial ou em cursos de Pedagogia ou licenciaturas, ter noções sobre as doenças e condições psicossociais vivenciadas pelos educandos e as características delas decorrentes, sejam do ponto de vista clínico, sejam do ponto de vista afetivo. Compete ao professor adequar e adaptar o ambiente às atividades e os materiais, planejar o dia a dia da turma, registrar e avaliar o trabalho pedagógico desenvolvido. (BRASIL, 2002, p.22).
A formação do professor da Classe Hospitalar assume a dimensão de uma educação inclusiva, pois deve trabalhar as potencialidades das crianças nos diferentes níveis e modalidades de educação, devendo explorar todas as maneiras de atendimento pedagógico. Nesse sentido, a formação deve ser trabalhada acompanhando o processo de humanização da saúde e do direito à educação para todos.
Fontes (2004), entretanto, alerta quanto ao fato da formação do profissional de educação para atuar junto à criança hospitalizada; para a autora, esse universo é pouco conhecido nas instâncias educacionais de formação pedagógica e, portanto, pouco explorado como lócus próprio de atuação do professor e local de aprendizagem (FONTES, 2004, p. 26).
Apesar do reconhecimento jurídico, moral e ético do atendimento pedagógico hospitalar, falta ainda a efetivação de tais políticas de forma universalizante. Essa modalidade ainda é muito pequena frente à demanda que existe concretamente. Isso se confirma diante do desconhecimento de muitos educadores de que o hospital é um campo de atuação profissional, que muito tem a contribuir para que se amplie a visão da criança, antes restrita à perspectiva da sua enfermidade.