ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR
Designação geralmente atribuída a Compayré (séc. XIX), remete para um campo de práticas de administração, gestão, governo ou direção de sistemas, ou redes escolares e de escolas, ou outras unidades de ensino e, simultaneamente, para um campo de estudos, teorias, disciplinas acadêmicas e cursos, ou programas. Como campo de práticas, inclui os aparelhos organizacionais e administrativos da educação escolar em seus distintos níveis: nacional, estadual, municipal, ou outros, consoante a organização de cada país, e os serviços que produzem políticas e orientações normativas para a educação escolar, incluindo ainda as escolas. Aos distintos níveis de intervenção, do ministério da educação a cada escola concreta, a Administração Escolar compreende as estruturas legais, organizacionais e administrativas, e também os atores e as ações com intervenção nos processos de utilização racional de recursos, ou meios, para a realização de determinados fins. Como decorre do conceito de administração (DUNSIRE, 1973), também a Administração Escolar envolve sentidos aparentemente contraditórios: por um lado, de governo, direção, definição de políticas e de filosofias de educação, planos de ação, normas e recursos; por outro lado, de serviço, apoio e execução detalhada das orientações políticas. A determinação da política, dos valores e objetivos, no primeiro caso, e a execução em conformidade daquelas orientações, dentro dos limites fixados, no segundo caso, representam desde o século XIX, e especialmente nos Estados Unidos da América, uma base da dicotomia entre política e administração e, mais tarde, da distinção entre administração e gestão no contexto industrial. Atualmente, porém, registra-se uma tendência no sentido de recusar a separação entre política e administração: toda a administração é um ato político e, no limite, não existe política sem administração. Isso não significa que a análise dos atores que formulam as políticas educacionais e controlam as principais funções de concepção, decisão, execução, avaliação, tal como a definição dos objetivos educativos, a determinação dos programas, a organização das redes de ensino, a atribuição de meios, a formulação de regras de funcionamento, a inspeção (DURAND-PRINBORGNE, 1989) não deva considerar as assimetrias de poder entre as autoridades e os atores escolares, ou entre os níveis centrais e locais. Em administrações de tipo centralizado, seja de feição concentrada ou desconcentrada, isto é, de natureza monocêntrica ou de características territorialmente dispersas, mas mantendo a centralização de poderes face às escolas, a descentralização, o reforço da autonomia das escolas e a sua gestão democrática são inviabilizados ou dificultados. No que concerne à distinção entre administração e gestão escolares, embora seja possível encontrar autores a sustentá-la, a questão não é consensual, dado que os conceitos são fluidos e intermutáveis (BARROSO, 1995). Na maioria dos dicionários, administração e gestão surgem como sinônimos, sendo também esse o entendimento da UNESCO (1988) no caso da educação. A expressão administração escolar tende a ser mais usada nos Estados Unidos da América, no Canadá e na Austrália, por exemplo, ao passo que gestão escolar surge como mais frequente na Grã-Bretanha e noutros países europeus (BUSH, 2003). No Brasil e noutros países, como Portugal, na sequência da democratização política, foi a expressão gestão democrática que conheceu grande protagonismo. No Brasil, a designação gestão escolar, ou gestão educacional, tem sido conotada como menos próxima da administração empresarial, recusando a tradicional subordinação do campo da Administração Escolar às teorias e práticas de origem industrial. Em Portugal e noutros países, porém, alguns autores concluem, em sentido inverso, atribuindo à palavra administração maior proximidade com as políticas e as instituições públicas. Isso significa que a questão não reúne consenso teórico, estando dependente das conotações dos dois vocábulos nas diversas línguas, e mesmo dos usos distintos da língua portuguesa, bem como de diferentes épocas históricas e contextos políticos.O debate terminológico implica já a consideração da Administração Escolar como campo de estudos, como disciplina ou especialidade acadêmica, com expressões variadas e existência intermitente desde finais do século XIX, em disciplinas universitárias de formação de professores, em diferentes países. No caso da América Latina, e designadamente do Brasil, Sander (1995) identificou a emergência de vários enfoques, com destaque para os enfoques jurídico e tecnocrático e, posteriormente, para o enfoque sociológico, análise coincidente com as de autores de outros países, embora nem sempre com as mesmas cronologias. O ensino e a pesquisa foram influenciados por abordagens legalistas, assentes na interpretação jurídica e, mais tarde, pela transferência de teorias e princípios da administração industrial e geral, proposta por autores da Administração Científica como F. Taylor e H. Fayol, para a Administração Escolar. Félix (1984) e Paro (1986) destacam-se na crítica à sobredeterminação teórica exercida pela administração empresarial capitalista sobre a administração escolar, tendo recusado uma definição de Administração Escolar como aplicação de uma administração geral ao caso concreto das escolas, a partir de uma pretensa universalidade de princípios (PARO, 1986: 11). A deslocação do campo das abordagens normativistas / pragmáticas para as abordagens de vocação analítica/interpretativa (LIMA, 2009) tem permitido que, ao longo das últimas duas décadas, a formação e a pesquisa em Administração Escolar tenham adquirido um pendor pluriparadigmático sem precedentes, com destaque para os contributos da Ciência Política, da Sociologia das Organizações, das Ciências da Administração, entre outros, e no domínio dos estudos educacionais, com relevo para os contributos da investigação em Sociologia da Educação e Políticas Educacionais. Trata-se de um movimento de refundação teórica, em boa parte conduzido através do ensaio de perspectivas críticas, em que as análises sociológicas e organizacionais, as abordagens sociopolítica e histórico-crítica têm revelado protagonismo e suportado novas investigações teóricas e empíricas, valorizando especialmente o estudo organizacional das escolas e das práticas dos atores escolares, bem como as articulações entre políticas públicas e administração das escolas.