DIRETRIZES CURRICULARES DA EDUCAÇÃO INFANTIL
As creches e pré-escolas, como parte do sistema de ensino, conforme determina a LDB (Lei nº 9.394/96), necessitam de Diretrizes Curriculares Nacionais para orientar suas propostas pedagógicas e suas práticas cotidianas junto às crianças. Essas Diretrizes estabelecem parâmetros básicos que articulam o processo peculiar de ensino-aprendizagem na educação infantil com as diferentes etapas da Escola Básica, vencendo a longa tradição assistencialista e escolarizante que tem marcado as creches e pré-escolas.
As primeiras Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil foram publicadas em 1999 (Resolução CNE/CEB nº 01/99). Dez anos após sua publicação, como resultado de pesquisas, discussões e mobilizações de diferentes setores, de modificações na legislação, tais como a mudança da idade de ingresso no Ensino Fundamental, o MEC, cumprindo sua função constitucional, decide estabelecer um processo de revisão das diretrizes curriculares de todos os níveis de ensino. Nesse contexto, em 2009, o Conselho Nacional de Educação aprova as novas diretrizes para a Educação infantil, após audiências públicas e ampla participação de diferentes segmentos sociais e de educadores de diversas partes do país.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil DCNEIs (Resolução CNE/CEB nº 05/09) destacam a necessidade de estruturar e organizar ações educativas com qualidade, articulada com a valorização do papel dos professores que atuam junto às crianças de 0 a 5 anos e 11 meses de idade. Estes são desafiados a construir propostas pedagógicas que, no cotidiano de creches e pré-escolas, permitam a escuta e a participação das crianças, acolham a forma delas significarem o mundo e a si mesmas, e promovam diversificadas situações em que elas são cuidadas e educadas.
Seus primeiros artigos definem a estrutura legal e institucional da Educação Infantil, consolidando a presença das creches e pré-escolas no sistema de ensino: número mínimo de horas de funcionamento, atendimento no período diurno, oferta de vagas próxima à residência das crianças, acompanhamento do trabalho pelo órgão de supervisão do sistema, idade de corte para efetivação da matrícula, número mínimo de horas diárias do atendimento e alguns pontos para sua articulação com o Ensino Fundamental. Além disso, nesses artigos, também há a definição de currículo assim como de criança alinhada com a concepção de criança como sujeito de direitos.
No artigo 7º, as DCNEIs estabelecem os elementos que compõem a função sociopolítica e pedagógica das instituições de Educação Infantil: a. Oferecer condições e recursos para que as crianças usufruam seus direitos civis, humanos e sociais; b. Assumir a responsabilidade de compartilhar e complementar a educação e cuidado das crianças com as famílias; c. Possibilitar tanto a convivência entre crianças e entre adultos e crianças quanto a ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas; d. Promover a igualdade de oportunidades educacionais entre as crianças de diferentes classes sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às possibilidades de vivência da infância; e. Construir formas de sociabilidade e de subjetividade que sejam comprometidas com a ludicidade, a democracia, a sustentabilidade do planeta e com o rompimento de relações de dominação etária, socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional, linguística e religiosa.
A função sociopolítica e pedagógica das instituições se completa se cada um e todos esses pontos forem observados. Esses pontos refletem grande parte das discussões na área e apontam o norte que se deseja, em ação compartilhada com a família, para a formação de cidadãos e novas subjetividades e sociabilidades comprometidas com a construção de uma sociedade democrática, livre, mais justa, solidária e ambientalmente sustentável. O foco do trabalho institucional orienta-se pelos direitos da criança na sua totalidade e integralidade, compreendendo-a como pessoa humana que, inserida em uma determinada cultura, apropria-se dela em especial por meio da brincadeira.
Em relação aos objetivos e condições gerais para a organização curricular das unidades de Educação Infantil, consideram as Diretrizes a valorização da diversidade de olhares, respostas e objetos de conhecimento, o alinhamento institucional em mediar o processo de construção de significados em relação ao mundo e a si mesmo por meio da apropriação pela criança de diferentes linguagens, e o compromisso de garantir os direitos da criança.
As experiências que devem ser cotidianamente promovidas junto às crianças abrangem um variado leque de atividades pensadas em relação à especificidade das condições de desenvolvimento de crianças de zero a três anos, e de quatro e cinco anos. O importante é todas as experiências de aprendizagem reconhecerem e promoverem a atividade criadora da criança. Com isso, são afastadas práticas pedagógicas centradas na ideia de transmissão de conhecimentos pré-consolidados e tratados como verdades, abrindo caminho para novas atitudes mediadoras por parte dos professores. As formas peculiares como essas crianças, nesse momento de suas vidas, vivenciam o mundo, constroem conhecimentos, expressam-se, interagem e manifestam desejos e curiosidades devem servir de referência para a tomada de decisões pela equipe pedagógica em relação aos fins educacionais, aos métodos de trabalho docente, à gestão das unidades e à relação da instituição de Educação Infantil com as famílias.
Dentro dos princípios da educação inclusiva, atenção especial é posta nas crianças com deficiências, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Acolher as especificidades do processo de aprendizagem dessas crianças e responder-lhes de um modo diferenciado, respeitoso ao tempo e à forma como elas se apropriam das vivências propiciadas na instituição de Educação infantil, é o caminho mais valioso.
A consideração da diversidade das infâncias brasileiras aponta para a necessidade de que as propostas pedagógicas estejam organicamente articuladas com a comunidade e grupo cultural das crianças. Destaca-se, nesse sentido, o diálogo que pela primeira vez é estabelecido na legislação nacional entre a Educação Infantil e a Educação do Campo, definindo diretrizes para a educação infantil das crianças dos territórios rurais (filhas de agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, assentados e acampados da reforma agrária, quilombolas, caiçaras, povos da floresta, os povos do campo, populações ribeirinhas, indígenas, etc.). A organização curricular das unidades de Educação infantil que atendem essas populações deve ser adequada às especificidades das mesmas e apoiar as tradições culturais por elas construídas. É mais um elemento que, na Educação Infantil, toma a diversidade como fonte de riqueza para todo educando.
As DCNEIs estabelecem que cada unidade deve construir sua proposta pedagógica, num processo de autoria e participação da comunidade, considerando uma ampla possibilidade de práticas cotidianas de trabalho de educar e cuidar das crianças desde que elas sejam organizadas de acordo com os princípios: a) Éticos da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades; b) Políticos dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática; c) Estéticos da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais.
Aprovadas as DCNEIs, uma desafiante agenda de trabalho se coloca para os responsáveis pelos sistemas de ensino e para as agências de formação inicial e continuada dos professores.