EDUCAÇÃO AMBIENTAL (EA)

Autores/as: LUIZ MARCELO DE CARVALHO

Processos educativos que procuram incorporar em suas propostas pedagógicas as implicações tanto teóricas quanto práticas do ideário ambientalista. A EA teve sua origem vinculada aos movimentos ambientalistas e à grande visibilidade que a questão ambiental assumiu nas décadas de 60 e 70, quando alguns setores da sociedade chamam a atenção para a gravidade dos problemas ambientais e os riscos impostos às diferentes espécies de vida, incluindo a humana, alertando para os limites do Planeta Terra e ameaças a sua sustentabilidade. Nesse período, vários encontros promovidos pela ONU, principalmente por meio da UNESCO e UNEP, contribuíram para que a questão ambiental se tornasse fato social, fornecendo elementos para a construção de discursos e práticas sobre a temática ambiental e sua relação com a educação. Se de um lado esses encontros podem ser entendidos como a face oficial da história da temática ambiental, de outro, o acontecimento ambiental será marcado pela eclosão do ecologismo contestatório, que tem suas raízes ideológicas nos movimentos de contracultura dos anos 60 (CARVALHO, I. , 2004). Embora não se possa falar em uma fundamentação teórico-metodológica consensual, alguns pressupostos podem ser considerados comuns aos diversos segmentos do movimento ambientalista. Assim, imerso em um ideário de buscas de transformações em diferentes esferas da vida social e influenciado pelas diferentes vertentes desses movimentos de crítica à sociedade consumista e materialista, de repúdio à racionalidade instrumental, aos ideais de progresso e ao individualismo (CARVALHO, I., 2004), o movimento ecológico chama a atenção para a necessidade de ações coletivas que levem à construção de novos padrões de relação sociedade – natureza, com bases em novas racionalidades. Para Bornheim (1985, p.18), a questão toda se concentra […] no modo como a natureza se faz presente para o homem; ou melhor: no modo como o homem torna a natureza presente. Nessa interpretação, os sentidos atribuídos à natureza pelas diferentes sociedades, em diferentes momentos históricos, não se revelam como algo natural (CAVALARI; CAMPOS; CARVALHO, 2001). Na verdade, são construídos historicamente como produtos da cultura. Assim, considerar meio ambiente não como sinônimo de natureza, mas como um campo de interações entre a cultura, a sociedade e a base física e biológica dos processos vitais (CARVALHO, 2004, p. 37) passa a ser uma das questões centrais para o movimento ambientalista e para as propostas de EA.

As críticas do movimento ecológico à racionalidade moderna e ao estilo de vida contemporâneo alimentam o argumento de que é necessário que os projetos de EA ampliem as abordagens teórico-metodológicas em relação à temática ambiental e ao processo educativo, incorporando o tratamento de questões que envolvam as dimensões valorativa – ética e estética – e política da realidade (CARVALHO, L., 2006).

As apostas na construção de novos padrões de relação sociedade – natureza, de espaços educativos que levem à produção de novos sentidos sobre o mundo, na busca de soluções para os problemas que desafiam a construção de um mundo mais justo marcam definitivamente a EA como “educação política”.

Essa dimensão política para a EA ganha concretude a partir de propostas que nos colocam em movimentos de “pensar o não pensado” (LEFF, 2002); “de desconstruir as ilusões de possíveis portos seguros”; de “desnaturalizar os nossos modos de ver o mundo”; de “construir novas possibilidades de lidar com as “incertezas” e com a natureza controversa e, muitas vezes, conflitiva das questões ambientais, de criar novos padrões éticos para a relação com a natureza e, assim, reinventar as formas de administração da Terra, que começa a ser compreendida como Oikos,ou seja, nossa casa: lugar de morada que guarda a vida.” O necessário diálogo de saberes – científicos, filosóficos, artísticos, populares, tradicionais, religiosos – apontam para a necessidade de se pensar em práticas que rompam com a lógica disciplinar e apostem nas experiências de integração entre esses diferentes saberes.

A complexidade, entendida como característica do acontecimento ambiental, aponta para a interdisciplinaridade e dialogia como princípios metodológicos por excelência para práticas de EA que, ao formar sujeitos para a ação política, aprofundam as experiências democráticas e apontam para a possibilidade de construção da cidadania ampliada pela dimensão ambiental (CARVALHO, I., 2006; JACOBI, 2003; REIGOTA, 2009; SORRENTINO, at al., 2005).

Tendo em vista as raízes históricas do movimento ambientalista e da própria EA, os referenciais propostos pelas perspectivas críticas em educação são percebidos por alguns educadores ambientais como aqueles que responderiam melhor às exigências teórico-práticas da área. No entanto, essas perspectivas críticas ganham contornos particulares a partir de referenciais mais amplos que as alimentam. Diferentes dimensões teóricas apontam para particularidades do ponto de vista das dimensões metodológicas para a EA (LAYRARGUES, 2004; GALIAZZI, FREITAS, 2005). Alguns grupos de pesquisa buscam no materialismo histórico dialético e nos autores vinculados à escola de Frankfurt os elementos para orientação dos trabalhos (TOZONI REIS, 2004; LOUREIRO, 2007). Outros buscam na fenomenologia as referências para a orientação de suas propostas (SATO, 2005; MARIN; LIMA, 2009) e outros ainda na hermenêutica (CARVALHO; GRÜN; AVANZI; GRÜN, 2009). Outros autores apontam como caminhos sugestivos para os trabalhos com EA as interpretações que tomam como base os estudos culturais (SAMPAIO; GUIMARÃES, 2009) e outros ainda as interpretações pós-estruturalistas ou pós-modernas (REIGOTA, 1999; WUNDER et al, 2007).

Embora a UNESCO tenha proposto para a década 2004 – 2014, a década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável,preferindo esta denominação à EA, os educadores latino-americanos fazem resistência a esta alteração, reafirmando o significado das raízes críticas da EA e apontando para as consequências político-ideológicas dessa mudança terminológica (GONZÁLEZ-GAUDIANO, 2007; CARVALHO, L., 2006).

Bibliografia

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