SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Autores/as: JOÃO VALDIR ALVES DE SOUZA

Ramo da Sociologia que trata especificamente da análise dos modos pelos quais as sociedades formam as novas gerações. Nas sociedades sem escolas, formar as novas gerações é uma tarefa para os adultos e idosos, os guardiões da cultura local. Nas sociedades modernas, onde a escola adquiriu grande centralidade como instituição educadora, essa é uma tarefa cada vez mais transferida para os especialistas do ensino. Nessas sociedades, não só a educação passou a se confundir com os processos de escolarização, como a complexidade desses processos passou a exigir uma ciência social que lhes desse explicação. Como a Sociologia é uma ciência das sociedades modernas e a educação passou a ser reivindicada cada vez mais como direito do cidadão e dever do Estado, a Sociologia da Educação, desde a sua origem, trouxe a marca de uma Sociologia dos sistemas de ensino ou uma Sociologia da escola.

São três as principais matrizes teóricas que constituem o campo de análise da Sociologia da Educação, as mesmas que fundamentam a Sociologia geral. Ainda que tenham sido muitos os autores que abordaram o tema e muitas as possibilidades analíticas, todas elas podem ser sintetizadas em três grandes vertentes explicativas: totalidade dialética, produção de sentido e causação funcional. A cada uma dessas vertentes explicativas corresponde a obra clássica dos três autores consagrados nos estudos sociológicos, respectivamente, Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim. No entanto, ainda que, em Marx e Weber, encontremos na análise que fizeram da vida social importantes referências para a análise dos sistemas de ensino, é somente em Durkheim que encontramos, de modo sistematicamente elaborado, uma Sociologia da Educação stricto sensu.

Se podemos dizer que com As Regras do Método Sociológico Durkheim estabeleceu o estatuto epistemológico da Sociologia, dando-lhe uma identidade e desmembrando-a da psicologia e da filosofia, foi com Educação e Sociologia que ele estabeleceu o estatuto epistemológico da Sociologia da Educação. Em ambos os casos, seja para tratar do fato social em geral, seja para tratar da educação como fato social, o objetivo central de Durkheim era atribuir uma objetividade ao seu objeto de análise, separando nitidamente aquilo que são as impressões pessoais acerca do que deveria ser a educação e a natureza mesma da educação enquanto prática social. Analisar e entender a educação como prática social era tarefa para uma ciência social, a Sociologia, cuja tarefa é conhecer; mudar o sistema por um gesto da vontade era tarefa da Pedagogia.

Uma das primeiras tarefas de Durkheim em seu clássico Educação e Sociologia é definir sociologicamente a educação. E ele o faz a partir de uma análise crítica do entendimento que tinham da educação alguns autores como John Stuart Mill, James Mill, Imanuel Kant e Herbert Spencer. Para definir educação, diz Durkheim, é preciso considerar os sistemas educativos existentes, ou que tenham existido, e extrair deles o que eles têm em comum. O primeiro elemento que Durkheim encontra como constitutivo de todas as sociedades conhecidas é a existência de uma geração de adultos, face à qual se apresentam as novas gerações que precisam ser formadas. A educação é, para a sociedade, diz ele, o meio pelo qual ela prepara no íntimo das crianças as condições essenciais da própria existência. O segundo elemento é o fato de que, em todas as sociedades, a educação se apresenta, sempre, sob o duplo aspecto: o de ser ao mesmo tempo uno e múltiplo.

O aspecto múltiplo da educação está ligado à diversificação social produzida pela história das diferentes sociedades e pela diversidade interna própria de cada sociedade. O principal elemento constitutivo dessa diversidade interna é a divisão do trabalho. A tarefa da educação, em seu aspecto múltiplo, é, pois, tanto situar as novas gerações em face da diversidade de ideais, quanto prepará-las para o exercício de uma especialidade exigida por essa divisão do trabalho. No entanto, diz Durkheim, por maior que seja essa diversidade, todos os sistemas educativos repousam sobre uma base comum. Não há povo em que não exista certo número de ideias, de sentimentos e de práticas que a educação deve inculcar a todas as crianças, indistintamente, seja qual for a categoria social a que pertençam. Isso é que constitui o aspecto uno da educação, isto é, que há nela de universal, comum a todos. Disso depreende-se que a educação tem a dupla função, em qualquer sociedade observada, de ser, ao mesmo tempo, diferenciadora e homogeneizadora. Vem desse entendimento a clássica definição de educação, como “a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine.” (DURKHEIM, 2001).

Durkheim não apenas criou a Sociologia da Educação como ciência, mas também como disciplina que deveria compor o currículo dos cursos de formação de professores. Para ele, tratava-se de uma disciplina de forte dimensão prática: permitir aos futuros professores conhecer o sistema de ensino para nele atuar com vistas a promover a reconstrução social por meio da educação. Em meados do século XX, no entanto, essa dimensão construtiva da disciplina perdeu força, vindo a renascer, no Pós-guerra, não como um conhecimento a orientar uma prática, mas como uma teoria a orientar uma crítica. Emerge e se consolida, com grande força, inspirado, sobretudo, nas formulações teóricas de Marx e Weber, o “paradigma da reprodução”, que aponta a educação não como fator de reconstrução social, mas de reprodução ideológica (Althusser), cultural (Bourdieu e Passeron), de classes (Baudelot e Establet), da ordem econômica (Bowles e Gintis). Na Inglaterra, centrada nos estudos do currículo, emerge uma Nova Sociologia da Educação, ou NSE, cuja tarefa é analisar como as estruturas de poder ordenam o conhecimento escolar.

Nas últimas décadas, houve uma explosão do objeto de estudo da Sociologia da Educação. Uma enorme quantidade de estudos mapeou a escola tentando entendê-la à luz das relações entre fatores internos (o currículo, a sala de aula, as relações professor/aluno) e externos (a estrutura socioeconômica, a diversidade cultural, as relações entre escola e família). Essas obras apontam para o que constitui, hoje, a problemática central da análise sociológica em educação: a relação entre escola e cultura, considerando a força dos condicionantes materiais e os processos culturais; os participantes são vistos na perspectiva de sujeitos ativos e não unilateralmente determinados pelas estruturas; intensa observação feita no interior do aparelho escolar sobre a vida na escola e fora dela, o mundo do trabalho e das relações sociais; um processo em que análises microssociológicas juntam-se a análises macrossociológicas na tentativa de produzir uma visão de conjunto sobre a instituição escolar e sua relação com a estrutura social.

Bibliografia

DURKHEIM, E. Educação e sociologia. Lisboa: Edições 70, 2001.